Uma viagem a Espanha

Este livro comprei em Goiânia (2019), quando estava a trabalho para a faculdade SENAC GO e precisei me mudar durante os 5 meses que fiquei por lá. Apesar de ter morado em um hotel neste período, pude me dedicar quase integralmente aos estudos, as leituras e as pesquisas que hoje geram retorno ao mestrado. E uma das vantagens de tê-lo comprado, mesmo usado, foi descobrir um autor brasileiro que não conhecia, ler algo com linguajar diferente e ambientações distintas do que já havia lido até então; ter uma visão diferente de algumas cidades Brasileiras que a personagem passa; e uma viagem a Espanha anterior a unificação que viria estabilizar as fronteiras modernas do país que conhecemos hoje.

O livro se passa em dois períodos distintos. No passado, na Espanha dominada pelos Árabes e no presente, nos séculos XX e XXI, com a personagem que carrega a história base. O livro é dividido de forma simples: quando o capítulo se passa no presente a formatação do texto segue o padrão de páginas já conhecido; e quando o capítulo do livro se refere ao passado, umas bordas desenhadas são apresentadas a impressão, um tipo de arabescos e detalhes da arquitetura árabes emolduram o texto, indicando ao leitor que o pedaço da história descrita no momento é outro. Ao dividir de forma visual o período representado a história se desenvolve.


No Brasil

No presente a personagem é um homem que nasceu no Rio Grande do Sul antes do regime militar, a ditadura do período, onde a personagem, no início de sua vida adulta vira um agente do DOPS e faz uma caça implacável aos antigos conhecidos, que era comunistas não assumidos, sem pensar em consequências. A personagem vivia o momento da ditadura com euforia e alegria pois estimulava seus preconceitos e posturas contra as diferentes formas de pensar. Ao terminar a ditadura e o regime democrático sendo reestabelecido, a personagem é obrigada a trabalhar como segurança em uma repartição pública. Ao receber uma nova equipe de indicações políticas, para chefiar aquela repartição, o então novo diretor, envia nossa personagem, o segurança, para o almoxarifado para viver, por lá, seus últimos anos de trabalho como servidor público. O tal chefe, representante político do governo eleito, fez aquela ação para se vingar do guarda que o pôs nos quartéis da ditadura por este se opor ao regime militar e como “troca de favores” enclausurou a personagem onde este não esperava terminar. No decorrer da história nossa personagem se casa por um tempo e depois terminar. Sua mãe envelhece e morre. Ele também se lembra dos períodos de infância, da mãe sendo uma senhora dona de Bordel nos arredores de Porto Alegre e vivia falando sobre o suposto pai dele como ele era um malandro esbelto. Ao lembrar dos estudos no internato, também lembrou dos abusos que um dos padres / professores causou a ele, e nos transtornos psicológicos que precisou levar a analista que acompanhou seus problemas. Ao se aposentar, não esperava receber elogios de alguns conhecidos do trabalho e passou a viajar pelo estado buscando informações de onde o pai poderia estar ou ter passado. Ao chegou em Curitiba encontrou um suposto conhecido dele. Descobriu parte da história perdida de família e entendeu que o pai foi morto por um bandido que não sabia perder uma partida de bilhar. Também descobriu que ele vinha da região de Granada, na Espanha. Com o nome em mãos, ao encontrar a região onde o pai poderia ter nascido, visitou o país e durante este período uma igreja da suposta região. Verificou os registros de nascimento e o então padre da igreja reconheceu o nome dele. Por semelhança chamou um famoso pesquisador/professor de história árabe da Espanha que o explicou como aquele encontro era inesperado. Por serem parentes distantes, tanto nossa personagem quanto o professor, continuaram a conversar sobre a origem da família. Foi-lhe confirmado da existência de sítio arqueológico preservado da época área e os mesmos visitaram este espaço. Além da visita também lhe foi entregue cópias dos registros oficiais da época dos árabes onde existem histórias de e relatos de personagens que moraram por ali no período. A surpresa foi que nossa personagem poderia ser um descendente de um famoso escriba dos reis árabes anteriores a unificação espanhola.


Na Espanha

No passado, o escriba viveu diversas situações conturbadas e difíceis onde momentos de grandes mudanças ocorreram e passavam diante de seus olhos. Ao fazer esses registros, dos acordos dos reis, sobre negócios, legislação, religião e situações cotidianas, o escriba também era um dos poucos árabes que conhecia tanto a fala quanto escrita cristã que auxiliava na transcrição e adaptação de documentos dos vários povos que habitavam a região. As disputas por espaço e cidades era constante o que levava as inevitáveis guerras das duas matrizes religiosas e entre os parentes da realeza, pois alguns queriam o controle total e outros queriam apenas seus tronos e continuar suas vidas de reis. Em um ponto, o escriba se apaixona pela rainha e o rei árabe descobre que a rainha quer realizar um motim para destroná-lo. Ao exilar sua esposa, o mesmo não a mata e se casa com outra mulher para continuar seu reinado. O filho mais velho da pseudo rainha, também é exilado com sua mãe e o descendente ao trono não é morto mas proibido de levar uma vida normal. A família da rainha exilada se orgulhava em ser a família que repassou as palavras do profeta para as gerações seguintes e por terem esse ‘registro histórico’ se viam no direito de proclamar os tronos do reino árabe como seus mas forças de fora da realeza se opunham a isso e a mantiveram exilada. O escriba vivia seu amor com a pseudo rainha de forma discreta e reservada pois ambos precisavam se proteger de qualquer suspeita do rei sobre eles. No passar dos anos, após a rainha foi libertada por sua família e voltar a viver livre, seus parentes queriam recuperar o trono e como sabia que outras famílias apoiavam mais um motim, organizaram revoltas. Algumas tentativas foram bem-sucedidas outras geraram problemas o que levou o seu reinado para as mãos dos reis cristãos que estavam unificando o país. Pelo conflito com outros parentes do antigo rei não terem parado, a união entre Granada e Espanha foi necessária para estabilizar parte dos conflitos. Tentaram destronar o pseudo rei mas perderam. Ao final, as forças cristãs, que eram mais numerosas e organizadas que as árabes, recuperaram o controle da região, expulsaram os árabes, unificaram o país e adaptaram as mesquitas em igrejas cristãs.


Curiosidades da obra

Com as mudanças de matriz religiosa, ao menos as igrejas e as mesquitas se mantiveram como locais religiosos na narrativa, mesmo que para outra religião devido a fatores além do controle delas.

O escriba deixa claro que não entende o que os cristãos querem mas que “Alá é o salvador e por ele todos os muçulmanos devem se reportar”. Uma forma curiosa de como a religião exerce influência e representa uma faceta da cultura tanto externa como interna de um país.

Os nomes árabes são diferentes dos ocidentais espanhóis e muito parecidos entre si. Muitas vezes. Não foi uma ou duas vezes mas muitas, mudando um ‘i’ por ‘y’ ou a posição de um ‘h’ ou ‘n’ na definição dos nomes. Outra característica é o nome das personagens árabes terem relação com a região ou cidade de origem, que eram acrescentadas aos seus nomes.


Enfim…

Uma visão diferente de dois períodos históricos distintos em países tão diferentes quanto ricos em histórias e tradições (Brasil, Espanha e Cultura Árabe). Uma descrição do final que o autor poderia ter evitado, é tê-lo escrito de forma muito violenta para pouco retorno prático. Parecia que não estava satisfeito com o já elevado nível de violência que a narrativa do livro tem e quis ser curto e grosso no desfecho da obra. Dispensável. Tirando este detalhe e outros menos indigestos, uma leitura diferente além de ser uma produção nacional. 

Até o próximo livro.
Ass.: Thiago Sardenberg

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