Pixar, uma história...
Gerenciar estúdios ou empresas de criação (independente do setor ao qual atendem) não é uma das tarefas mais fáceis que existe. Imagina gerenciar as pessoas que participam dela? Quanto maior for a ambição dessa empresa, mais complexa será a sua gerência e maiores dificuldades o trabalho do gerente será. O maior desafio de um gerente é sempre fazer o ser humano executar suas tarefas sem sair muito do lugar comum, porém este lugar comum é onde o comodismo irá se instalar e no subconsciente das pessoas permanecer. O marasmo da mesmice a faz não querer mudar para algo diferente ou melhor e este é um entrave que qualquer empresa irá passar. Imagina quando este estúdio é o pioneiro na produção de filmes em 3D para o cinema e seu gestor máximo é o próprio Steve Jobs? Sim, ele mesmo, o criador da Apple e do iPhone… O que passaria na sua cabeça? Um sonho? Um desespero? Uma imagem milagrosa na sua frente? Uma oportunidade única de transformar sua vida? Vamos por partes...
Versão Brasileira e Versão Americana, na prática a mesma capa, com a mesma letra e as mesmas informações relevantes na frente.
Criar tecnologias é uma coisa, sobreviver vendendo computadores é outra. O primeiro trabalho da Pixar não foi criar filmes mas vender máquinas que oscilavam entre os computadores da Apple (específicos e de nicho) e os da Silicon Graphics (muito caros e mais específicos ainda). Como a produção de filmes em computador, com recursos e ferramentas ainda embrionários, mexeria com a produção hollywoodiana, de dentro pra fora, de uma forma nunca antes tentada por outras partes da indústria, ou a Pixar iria morrer fazendo ou entraria na crista da onda sem saber onde seria levada. Na pior das hipóteses, morrer tentando era a situação menos alarmante mas a que o time menos queria passar.
Muitos percalços e problemas ocorreram até entrar numa problemática sem tamanho. Jobs havia informado que iria vender a Pixar, antes mesmo dela começar a produzir filmes, e como não vendia computadores suficiente para sobreviver, a solução era se desfazer desse imbróglio. Desse estímulo, alavancou o engajamento da equipe na produção de Toy Story. Com o sucesso e o retorno financeiro do filme salvando a empresa, a produção dos filmes posteriores começaram…
Pra entender o que a Pixar fez, outros problemas por fora dela também ocorreram e um deles era a própria Disney. Como as equipes, dentro dos estúdios Disney estavam acostumadas com um ritmo de trabalho específico, e já sabiam como as coisas nos cinemas e na TV ocorriam, a experiência de produção já era bem conhecida pelos seus diretores e produtores mas usar computadores para fazer filmes? Isso era uma novidade e a gestão da Disney, nos anos 80 quase 90, não comprou a ideia. Dessa forma, tempo e esforço no desenvolvimento de novas ferramentas seria dispendioso mas o estúdio foi em frente da sua forma e por N outros caminhos e chegou no filme que iria mudar sua história.
Ao mencionar que o grande problema da gestão de empresas era fazer o ser humano sair da sua zona de conforto, a Disney estava na sua zona de conforto fazia anos e as equipes, dentro dela, não conseguiam sair das suas burocracias internas ao ponto de nem produzir com afinco nem emplacar novos sucessos comerciais nos cinemas para salvar suas produções. Esta foi a oportunidade para a Pixar, em sua forma de fazer filmes e organizar equipes em processos criativos diferenciados, fez a sua gestão em prol da criatividade um ativo empresarial.
A cultura empresarial, de qualquer companhia, pode engajar seus funcionários a superar desafios e gerar soluções viáveis e importantes para os problemas internos, ou sufocá-los com tantas amarras processuais e contratuais exageradas que seus gerentes podem não perceber onde estavam errando. E neste ponto, a Pixar trabalhava para evitar os entraves da produção enquanto a Disney se agarrava as suas tradições e se engessava sem perceber.
Uma série de anos, momentos, situações, filmes e acordos comerciais se passaram até a bem-vinda venda da Pixar para a Disney ocorrer em um momento oportuno para ambas. Foi da cultura empresarial da Pixar que, mover seus diretores para sede da Disney, os fez conhecer as burocracias internas da Disney ao ponto deles precisarem mudar muitas peças para, enfim, salvá-la do seu ostracismo operacional iminente. Apesar de ter demorado alguns anos até conseguir mudar a cultura interna, já instalada, salvar a Disney demorou mas os recursos financeiros existentes salvaguardaram, em parte, a Pixar. Apesar de ter sido uma compra, estas ações também são conhecidas como fusões de empresas e nesse ponto, os diretores da Pixar fizeram tudo o que estava ao seu alcance manter a cultura dos estúdios Pixar intacta. Foi dessa decisão que a troca dos diretores de local também levou novas formas de administrar equipes e processos que revitalizou a fadada Disney.
A ideia por trás da decisão foi não misturar os grupos e garantir que ambos teriam trabalhos, produções, oportunidades e processos produtivos distintos. Mesmo que a Pixar ficasse conhecida como o departamento de animação 3D da Disney (modernidade e progresso) e a Disney Animation Studio fosse a responsável pelos projetos 2D do conglomerado (tradicionalismo e comodismo), manter as equipes separadas, causou a manutenção dos recursos financeiros disponíveis, em distintos projetos e equipes. Eram duas empresas não uma maior que outra. Eram dois times específicos. Eram duas diretorias diferentes. Eram dois organismos vivos que sobreviviam sem se conhecer antes e precisava continuar assim.
Graças a essa separação, as empresas seguiam suas produções e ritmos mas compartilharam importantes mudanças. A Disney conhecia o mercado, a distribuição, o marketing das venda de produtos de entretenimento. A Pixar conhecia o processo de produção de filme 3D e de gestão criativa da empresa, como engajar pessoas e mantê-las ativas em seus trabalhos ou ouvir seus funcionários e os problemas de produção que as equipes passavam. Perceba que a palavra colaborador aparece pouco neste texto porque no livro ela também aparece poucas vezes. A Disney conhecia o mercado ao qual ela criou e precisava manter, em diferentes setores e negócios. A Pixar valorizava pessoas e relações acima dos negócios e das situações escusas que alguns, muitos, contratos causavam em funcionários de outras empresas.
Quando, Ed Catmull e outros diretores da Pixar, perceberam como eram empresas tão diferentes e distantes, uma da outra, a troca de administração também fez bem a Disney. Mesmo que os diretores da Pixar estivessem longe de seus ‘postos’ eles ainda eram reconhecidos pelos funcionários da Pixar como seus lideres e eles precisavam passar mais tempo neste estúdio e não na Disney. E disso outros problemas surgiram e precisavam ser resolvidos.
Ao final do livro, o autor dedica algumas frases para exemplificar como é possível melhorar a relação entre gestores e funcionários, sem que ambas as pontas caiam no ostracismo do comodismo da repetição de tarefas conhecidas nem nas infindáveis tarefas delegadas e delargadas pela burocracia interna de suas gigantecas organizações.A gestão criativa de empresas passa pela empatia de seus lideres e o acesso constantes dos funcionários a eles onde a transparência na comunicação direta entre as pessoas ocorra sem entraves burocráticos dos cargos de maior hierarquia ou novatos não tenham voz ativa.
Ouvir com sinceridade e imparcialidade sugestões e críticas não é levar para o lado pessoal aquelas observações, muitas vezes justificadas, mas favorecer todos os relacionamentos interpessoais a algo maior e mais importante e que vai muito além das relações contratuais dentro daquelas paredes.
Favorecer um feedback proativo de todos os departamentos em prol de uma relação mais harmoniosa entre as partes é um ponto pois o trabalho final da Pixar é levar a alegria de ver um filme memorável ao público que visita cinemas regularmente.
A satisfação geral dos funcionários é um ativo da empresa não uma meta a ser alcançada. Meta é a excelência na entrega de trabalhos memoráveis para o público que vai assistir os filmes.
Esta relação de trabalho não é um casamento abusivo com um contrato que se autorregula e se impõe sobre ambas as partes. A gestão criativa de empresas é fazer uma troca constante de experiências e visões sobre o que está ruim e precisa ser melhorado, mesmo que passe pelo cancelamento dos projetos, ou demissões de pessoas que não estão agregando nada a eles.
Um livro de cabeceira com cara de auto ajuda mas com uma pitada de biografia e história de vida do autor que vai muito além de apenas umas horas perdidas em uma leitura enfadonha. As experiências repassadas nele mostra aos de fora, e aos mais novos, como é fundamental rever e estar atento a diversos problemas e para proteger as pessoas que compõe a empresa é preciso encará-los. A promulgação do progresso que ela precisa ter para sobreviver ao futuro incerto que os espera vai gerar medo e receios nas pessoas mas criatividade só é interessante porque ter medo rumo ao desconhecido faz parte do processo de criação.
Até o próximo livro.
Ass.: Thiago Sardenberg
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